Lô Borges morreu aos 73 anos neste domingo (2). A informação é do jornal O Tempo, de Belo Horizonte. Ele estava internado desde 19 de outubro, após uma intoxicação por medicamentos.
Em 22 de outubro deste ano, foi anunciada a internação de Lô Borges em um hospital em Belo Horizonte, poucos dias depois da notícia de que Milton Nascimento, um dos seus principais parceiros e incentivadores, estava com demência.
Sexto filho do casal Salomão e Maricota Borges, Salomão Borges Filho, o Lô Borges, nasceu predestinado à música. Os pais eram músicos amadores – e a casa cheia de filhos, seriam 11 ao todo, facilitou um ambiente propício a melodias e poesia.
Lô contava que aprendeu a tocar violão com a bossa nova, ainda menino. Mas o grande encanto veio mesmo com os Beatles, conjunto que se reuniu a partir de 1960. Ainda de calça curta, como ele costumava falar, formou a banda cover The Bevers para cantar em programas infantis de TV em Belo Horizonte. Além de Lô, estavam na banda Yé Borges, seu irmão, Beto Guedes e Márcio Aquino.
Dentro de casa, Lô se ligaria musicalmente principalmente com seu irmão seis anos mais velho, Márcio Borges, o Marcinho. Os dois estabeleceram um relação duradoura e produziriam obras-primas da música popular brasileira.
Como não se bastasse uma casa cheia de meninas e meninos querendo fazer música, o casal ganhou um filho postiço, Milton Nascimento, o Bituca, que de vizinho virou presença assídua do apartamento dos Borges, no Edifício Levy, no centro de Belo Horizonte.
Bituca passou a compor com Marcinho e só descobriu que Lô havia deixado de ser um menino quando os dois foram juntos a um bar próximo ao Levy, e Lô revelou aos 18 anos que estava compondo. Nesse mesmo dia, fizeram Clube da Esquina, que ganhou letra de Marcinho e foi gravada por Bituca no álbum Milton, de 1970.
A história de Lô se cruzaria com a de Milton de maneira definitiva pouco tempo depois. Já consagrado com canções como Travessia, Morro Velho e Canção do Sal, e tendo, inclusive, gravado um disco para o mercado estrangeiro, Milton estava em busca de um som novo. Resolveu ir novamente para Belo Horizonte encontrar os amigos. Pensou logo em Lô, na época, com 19 anos.
– Vamos para o Rio fazer um disco – disse Milton ao pupilo.
De Belo Horizonte, os dois partiram para Niterói, para uma casa na Praia Piratininga. Por lá, tiveram tempo para compor com calma e receber amigos como Marcinho, Beto Guedes, Wagner Tiso e Ronaldo Bastos para lapidar as canções.
Difícil mesmo foi Milton convencer a gravadora Odeon de que queria assinar um disco com um jovem desconhecido de Belo Horizonte. E mais: queria fazer um disco duplo. O álbum Clube da Esquina, de 1972, batizado inspirado pela esquina na qual jovens como Lô se reuniram para tocar música em Belo Horizonte.
Com a repercussão do álbum, Lô foi convidado pela gravadora para lançar seu primeiro álbum solo, logo em seguida. Ele aceitou o convite, mas não tinha uma música sequer pronta, além das que havia feito para o Clube, conforme contou em entrevista ao Estadão em 2021.
– Pirei. Fiz um disco todo experimental, psicodélico. Não tinha nenhum Trem Azul (sucesso do Clube). Tinha música de 30 segundos, outras de 5 minutos. Fazia o que vinha na cabeça. E o que vinha era muita loucura. Fazia a melodia pela manhã, à tarde o Marcinho colocava a letra e à noite eu gravava – afirmou.
O álbum, ignorado na época, mas amado até os dias de hoje, ficou conhecido como “o disco do tênis”, em referência à capa, que traz um par de tênis de segunda mão que ele havia ganhado de um primo – embora leve apenas o nome do compositor como título.
Depois da estreia solo, Lô só lançaria outro disco sete anos depois, em 1979. A Via Láctea colocaria o compositor em evidência não apenas pela faixa-título e de Equatorial, mas também pela versão com letra de Clube da Esquina nº2, feita por Márcio Borges a pedido da cantora Nana Caymmi. Antes, porém, o Clube se reuniu novamente para o álbum Clube da Esquina nº 2, no qual Lô contribuiu com canções como Ruas da Cidade e Pão e Água.
Lô seguiu gravando nos anos 1980. Nessa década, lançou Nuvem Cigana (1982), Sonho Real (1984) e Solo (1987). Em 1996, foi a vez de Meu Filme, que contou com a participação de Caetano Veloso na bossa Sem Não. Também deu sua versão para Te Ver, hit do Skank.
Em 2001, fez uma retrospectiva da carreira ao lançar o álbum Feira Moderna, com regravações de canções como Para Lennon & McCartney, Equatorial, Nuvem Cigana, O Trem Azul, Sonho Real, além da faixa-título.
Lô se juntou ao também mineiro Samuel Rosa, em 2016, para o álbum Samuel Rosa & Lô Borges – Ao Vivo No Cine Theatro Brasil. Além de novas versões para sucessos de ambos, apresentaram inéditas, entre elas, As Noites e Dupla Chama, e Dois Rios, parceria de ambos com Nando Reis que se tornou sucesso, o primeiro de Lô desde os anos 1980.
Em 2018, em um álbum ao vivo gravado no Circo Voador, no Rio de Janeiro, Lô juntou músicas de 1o disco do tênis e do Clube da Esquina. A partir de 2019, entrou em um período de grande atividade e lançou um disco por ano com composições inéditas: Rio da Lua (2019), Dínamo (2020), Muito Além do Fim (2021), Chama Viva (2022), Não Me Espere na Estação (2023) e Tobogã (2024). Em 2025, dividiu um disco com Zeca Baleiro, Céu de Giz.
Para Lô, a composição era um “ato cotidiano”, como declarou ao Estadão.
– A composição é meu alimento espiritual. É o momento em que a vida faz mais sentido para mim. Compor é amar. Se eu não componho, sinto que falta algo – disse, em 2021.



